COLABORADORES

O preço
Autor: Carlos Adauto Vieira
Vencida a Revolução de 30, Getúlio Vargas mandou fazer uma auditoria nos vários ministérios para se assenhorear da situação de cada um.
O mais problemático foi o Ministério da Viação e Obras Públicas, hoje denominado dos Transportes. Já era na época e nunca mudou, se não para pior. Como estamos vendo.
Getúlio procurou entre os seus amigos revolucionários quem o poderia ajudar a sanear este problema sem se comprometer com a corrupção.
Havia muitos nomes, mas de confiança para a missão, bem poucos. Getúlio os conhecia bem e de sobra. Forçoso encontrar o homem!
Do bolso do colete, entre a coleção, juntinho ao próprio coração, existia um nome incorruptível. O Robespierre dos pampas, Salgado Filho.
Getúlio acendeu outro charuto, sorriu de si para consigo e pediu o telefone.
Pelo fio, após umas horas de espera, conseguiu a ligação. E quando reconheceu a voz do conterrâneo, herói da revolução vitoriosa, homem da sua mais absoluta confiança, disse-lhe simplesmente: “Vem ao Rio, que necessito de ti, mas tem de ser sigilosamente, em verdadeiro segredo de justiça. Voa, tchê!”
O velho e inexcedível amigo não se fez de rogado: largou tudo e embarcou no seu carro para o reencontro com o seu chefe político. Em lá chegando, já o esperava, ansioso, o presidente, que o abraçou carinhosamente, revelando a gratidão pela amizade sem suspeita, tão rara hoje. “Tenho uma tarefa hercúlea para ti e não me podes faltar. És o único dos companheiros amigos a quem posso confiá-la...”
- Em que consiste? Outra revolução?
- Pior, meu general. Um ministério... o de Viação e Obras Públicas. O maior antro de corrupção ativa e passiva da República. Há que exterminá-lo e só tu, pelo teu caráter, és capaz disso. Como sei que todos têm o seu preço e te conhecendo como te conheço, sei que jamais chegarão ao teu...
- Espera aí, queres que largue todos os meus compromissos para assumir este? Desculpa, mas não posso aceitar. Já fiz o que fiz pela tua vitória na revolução. Agora, quero a paz da estância.
Porém, Getúlio era persuasivo e o convenceu a aceitar. Aceitou!
Tomou posse e três meses depois, foi ao Catete e disse que vinha entregar o cargo, embora a missão não estivesse completa.
- Por que? – perguntou Getúlio, pasmo.
- Porque estão chegando muito perto do meu preço.


Memorias de PMs
Autor: Carlos Adauto  Vieira
Na adolescência, após o ingresso no curso médio do Ginásio Catarinense, famosíssimo e dificílimo na época, passei a freqüentar o quartel da Polícia Militar de Santa Catarina, até porque fiz amizade, mantida e aprimorada até hoje com filhos de oficiais, como o Carlos Hugo Stockler de Souza, o Airton Spalding.
Íamos ao Quartel para cumprir o mens sana in corpore sano, aprendendo e praticando esportes, além de ética e cidadania.
Como os caminhos da vida são imprevistos, afastamo-nos em determinada fase, sem perder a amizade, pois consolidada e facilmente recuperável.
Reatamos o velho e sólido relacionamento, descobrindo-nos virtudes semelhantes: Ambos (Hugo e eu) escrevíamos. E, na troca de livros pessoais, recebi as suas memórias e pesquisas sobre a pesca submarina em Santa Catarina, de que foi um dos pioneiros, já oficial da nossa Força Pública. Excelente obra com fartura de fotos das pescas e dos pescadores num tempo em que Ecologia não era uma necessidade legal. Lendo-o, numa prosa bastante coloquial e muita descritiva das performances e dos percalços, quase a gente se esquece de que as espécies, vegetais,  animais e humanas são extintivas, se se as agride inocente ou propositadamente. Os pescadores submarinos da época eram inocentes desportistas, o que justifica o prazer desta leitura sem a possibilidade ser-se biodesagradáveis.
Porém Hugo, ante o sucesso literário e histórico, não parou e nos deu “Do  Laço Húngaro às Estrelas”, símbolos das patentes militares da nossa .brava milícia catarinense.
Neste é mais ele, o Hugo do nosso tempo.  As páginas vão rolando como se estivessem a contar-nos os trechos da sua vida militar à beira de um fogão de chão assando costela; o chimarrão bem cevado com erva nova; uma canguara a passito para solidificar o vinho ou a cerveja. Não há preocupação de literatura, mas, simplesmente do seu estilo, aquele jeito franco, às vezes reticente, noutras completo, com uma memória invejável para cada detalhe, cada pergunta e, mais que tudo, para  cada resposta ao questionamento indesejado. Entretanto, em instante algum a despreocupação com a dignidade de membro da nossa Polícia Militar; antes, dando os exemplos da sua ética formação. E militar, que viveu uma boa parte da História Catarineta.
Trata-se ainda, de um livro bem editado, com uma capa colorida com o Laço Húngaro em cores da briosa Corporação, pela Above Publicações de Vila Velha – ES.
Hugo nos promete mais algumas obras com as quais, certamente, se tornará estrela da Literatura de Santa Catarina. Ou, do próprio Brasil.

O lago congelado
Colaboração de Waldir Luiz Neumann 
Autor Desconhecido
Conta certa lenda que estavam duas crianças patinando num lago congelado.
Era uma tarde nublada e fria e as crianças brincavam despreocupadas.
De repente, o gelo se quebrou e uma delas caiu, ficando presa na fenda que se formou.
A outra, vendo seu amiguinho preso e se congelando, tirou um dos patins e começou a golpear o gelo com todas as suas forças, conseguindo por fim quebrá-lo e libertar o amigo.
Quando os bombeiros chegaram e viram o que havia acontecido, perguntaram ao menino:
- Como você conseguiu fazer isso?
É impossível que tenha conseguido quebrar o gelo, sendo tão pequeno e com mãos tão frágeis!
Nesse instante, um ancião que passava pelo local, comentou:
- Eu sei como ele conseguiu.
Todos perguntaram:
- Pode nos dizer como?
- É simples - respondeu o velho.
- Não havia ninguém ao seu redor, para lhe dizer que não seria capaz.


O colar de turquesas azuis 
Autor desconhecido
O homem por detrás do balcão olhava a rua de forma distraída enquanto uma garotinha se aproximava da loja. Ela amassou o narizinho contra o vidro da vitrine. Os seus olhos da cor do céu brilharam quando viu determinado objeto.
Ela entrou na loja e pediu para ver o colar de turquesas azuis, então disse ao balconista:
- É para minha irmã, você pode fazer um pacote bem bonito?
O dono da loja olhou desconfiado para a garotinha e lhe perguntou:
- Quanto dinheiro você tem ?
Sem hesitar ela tirou do bolso da saia um lenço todo amarradinho e foi desfazendo os nós. Colocou-o sobre o balcão e disse: 
- Isso dá, não dá ?
Era apenas algumas moedas que ela exibia orgulhosa.
-  Sabe, - continuou, - eu quero dar este presente para minha irmã mais velha. Desde que nossa mãe morreu ela cuida de  mim e não tem tempo para ela. Hoje é aniversário dela e tenho certeza que ela ficará feliz com o colar que é a cor dos olhos dela.
O homem foi para o interior da loja, colocou o colar em um estojo,embrulhou com um vistoso papel vermelho e fez um laço caprichado com uma fita azul.
- Tome - disse para a garotinha, - leve com cuidado.
Ela saiu feliz saltitando pela rua abaixo. Ainda não acabara o dia quando uma linda jovem de cabelos loiros e maravilhosos olhos azuis adentrou na loja. Colocou sobre o balcão o já conhecido embrulho
desfeito e interrogou: 
- Este colar foi comprado aqui?
- Sim senhora, - respondeu o dono da loja.
- E quanto custou?
- Ah!", - falou o lojista - o preço de qualquer objeto em minha loja é sempre um assunto confidencial entre o vendedor e o cliente.
Mas minha irmã tinha somente algumas moedas. E este colar é verdadeiro, não é? Ela não teria dinheiro para pagar por ele.
O homem tomou o estojo, refez o embrulho com extremo carinho, colocou a fita e devolveu à jovem dizendo:
- Ela pagou o preço mais alto que qualquer pessoa pode pagar. Ela deu tudo que tinha.


Macheza

Autor: Carlos Adauto Vieira

Sol de quase  meio-dia. Empapados de suor, os estivadores  trabalham. Nem uma viração. Nem um soprinho de vento. O mar  sereninho, sereninho. Só o cabo do guincho geme com o peso da madeira, que vai sendo empilhada no porão, onde um terno a dispôs em ordem, ocupando o menor espaço vago.

“Carioca” comanda este terno. Há seis anos apareceu no “ponto”, oferecendo–se para trabalhar como bagrinho. Vinha do Rio. Daí o apelido. Depois de uma briga com três gringos – dois jogados n’água e um cortado à  faca – ganhou fama de valente  e passou a ser muito respeitado. Outras vitórias em brigas contra seus colegas de serviço, marinheiros, policiais, aumentaram a sua fama, que ninguém se atrevia  a desmanchar, enfrentando-o.

Guincho sobe e desce. “Ganancinha” maneja-o, limpando o rosto com um pedaço de estopa. É tijucano. Foi embarcadiço, mineiro, peão, enfim, percorreu meio mundo antes de ingressar na estiva. Calmo, alegre, trabalhador, respeitadíssimo por suas opiniões e posições em favor da sua classe. É dos que sempre se manifestam nas assembléias, com acerto e ponderação. Especialidade de companheiro, reconhecem todos. Nunca mexeu com ninguém. Dá-se com todos  e todos dão-se com ele. Até mesmo os pelegos.

Guincho sobe e desce. Gemendo sempre, como se fosse a voz dos estivadores cansados, empapados de suor, cuja vida é fazer força,  cada vez mais força. O dia está mesmo brabo  de tão quente.

- Parece um inferno - a expressão sai  como um desabafo. Uma tensão vai tomando conta  daqueles homens, mal dormidos, mal alimentados, sufocados de pelo calor e pelo trabalho  tão pesado. De repente, a lingada escapa em cima dos homens no porão.

Ganancinha grita, advertindo. Safos, todos conseguem evitar a tragédia. Uma tábua porém risca a perna do Carioca, que sangra.

- Cabra da moléstia , burro - grita  para o Ganancinha, já à boca do porão.para ver se houve algum ferido.

E partem um para o outro, tremendo ambos de raiva.

Tudo pára. Todos os olhares se voltam para os dois. No convés se encontram frente  a frente. Se miram. Chegam a sentir o bafejo um do outro. Mas param, voltam aos seus postos, compreendendo que eram os dois mais machos ali do porto  e que não valia a pena brigar. 



Parabéns Pomerode!!! 
Celso Deucher*
          Era 18:30 horas... Em Brusque um grupo de casais preparava-se para pegar a estrada e ir até a cidade mais alemã do Brasil, Pomerode. O motivo eram as comemorações do segundo aniversário do teatro municipal da cidade e a curiosa apresentação de um grupo que inventou de misturar vários estilos musicais e resolver inclusive colocar dança num show que deveria ser um Concerto de Câmera.
         As 19:30 horas estávamos todos lá na terra dos pomeranos. Eram quatro casais de Brusque, além de diversas outras pessoas das terras de Schnéeburg. O belíssimo teatro municipal, de causar inveja a nós brusquenses foi aos poucos se enchendo e como tira gosto aconteceram algumas apresentações de artistas locais, todos do mais alto nível.
Chegou afinal a hora do show principal...
         Na penumbra do belo palco anunciaram-se um pianista, um violinista, um vioncelista, um bandoneonista, um tenor e ainda um grupo de dança alemã e um casal dançarinos de tango. Era a apresentação de um show totalmente diferente do que tínhamos visto até hoje. Um show inesquecível... Não foi somente um concerto... Foi um show digno dos melhores que já tive a oportunidade de assistir. O programa musical abrangeu diferentes estilos musicais saindo da música barroca até a moderna.
A nova Orquestra da Câmera de Pomerode se apresentou maravilhosamente com composições para violino e piano de Antonio Vivaldi, Niccoló Paganini e Alberto Curci. Simplesmente impecável a atuação no violino do solista Gilson Padaratz e do  pianista internacional Gian Pietro Bontempi. O tenor Demetrio, protagonista deste evento já o havia visto de apresentar com diferentes grupos e especialmente com a Orquestra Sinfônica de Florianópolis. Neste evento Demétrio foi um espetáculo levando o público ao êxtase com varias óperas italianas de Verdi, Leoncavallo e Puccini. Mostrou a variedade do seu repertorio executando também clássicas canções do repertório italiano.
Mas não poderia deixar de falar que no grupo Orquestra da Câmera se destacaram três peças para bandoneon, piano, violino e violoncelo, no estilo popular alemão, afinal estávamos na bucólica Pomerode; Foram composições inéditas que Padaratz, tempo atrás, encontrou no acervo do musico Alfredo Rasdloff.  As composições para bandoneon foram executadas pelo músico Roberto Maske e as partes do violoncelo pelo maestro Thiago Bezerra. Todos simplesmente impecáveis nas interpretações.
Já na primeira participação do bandoneon tivemos a importante participação dos componentes do Grupo Folclórico de Pomerode, um dos mais antigos de Santa Catarina e que levou o público a uma viagem ao passado. Na condição de convidados especiais também deram um show os bailarinos Roberto e Carla de Blumenau que tiraram o fôlego do publico numa bela dança do tango.
O concertista italiano, pianista Gian Pietro Bontempi conseguiu os delicados timbres do Impressionismo Frances, tocando um prelúdio de Claude Debussy. A mágica atmosfera  de Chopin, o “Poeta do Piano” apareceu nas delicadas notas da valsa op. 69 n.2.
No teatro havia um caloroso publico que com uma atenção própria dos grandes concertos aplaudiu calorosamente os concertistas. Lá estavam o prefeito da cidade, Dr. Pizzolati, que amavelmente nos deu boas vindas, assim como a vice prefeita Gladis e seu esposo, além da coordenadora do Departamento de Cultura do município, Rosita Jung e outras autoridades.
Chamou especial atenção a presença de gente de diversas cidades de Santa Catarina e de convidados muito especiais que presenciaram o evento. Entre eles lá estava o sempre prestigiador da Cultura Sulista, Desembargador Carlos Prudêncio, de Brusque, e o renomado escritor e advogado, Adauto Vieira, de São Francisco do Sul, todos acompanhados de suas esposas.
Todos os brusquenses foram unânimes: a nova Orquestra de Câmera de Pomerode começou muito bem e deu um verdadeiro show digno dos melhores concertos europeus.
Em resumo, foi uma das mais agradáveis noites que passamos na bela Pomerode. De parabéns a administração municipal e o povo desta cidade que mantém firmemente os valores trazidos por seus antepassados da longínqua Alemanha. Mas muito além disso, parabéns pelos dois anos do novo teatro municipal e que outros eventos desta estirpe lá aconteçam. Certamente sempre que possível lá estaremos para assistir tão belas manifestações artísticas do nosso povo.
 *O autor é jornalista e escritor em Brusque SC.


Grécia: Aonde nasceu a Democracia, agora tem a Ditadura.
Por Gian Pietro Bontempi.
Na Grécia os atuais protestos contra o governo  que se transformaram em atos de violência e confrontos com a polícia, são  reações às medidas anti-populares que prevêem o congelamento dos salários e o aumento dos  impostos. Cerca de oitenta por cento dos cidadãos já há algum tempo, pedem a demissão do governo  e uma maioria quer a saida da Grécia da Comunidade Europeia.
Depois das previsões ambiciosas dos anos noventa sobre os benefícios de uma moeda única européia, todos esperavam resultados concretos. Ao contrário, as expectativas  foram negativas e os cidadãos comuns se encontram hoje com os preços de mercadorias e serviços três vezes mais caros e quase com os mesmos salários de dez anos atrás.  A Europa, que deveria se tornar “Europa dos povos”, demonstrou, ao invez disso, a Europa dos grandes burocratas da política e dos bancos centrais. Sob o controle de um governo autoritário que quer manter grandes privilégios  de uma mínima parte da população,  sacrificam-se os cidadãos com altos impostos, congelam-se os salários e se reduzem os direitos sociais.
Vale a pena lembrar que eminentes economistas americanos, na época da introdução da moeda única, haviam manifestado dúvidas sobre a operação monetária, sem ter preventivamente harmonizado a economia de diferentes países e também integrado a cultura dos povos. Mas, o pior aspecto da Europa é representado pela Grécia e pelo risco da depressão econômica em outros países como Espanha, Portugal, Irlanda e Itália. Tudo isto demonstra que não é suficiente unificar as moedas com uma decisão política, se antes não se constituir a integração dos povos.
No caso específico, a Grécia não tem nenhuma possibilidade de sanar sua dívida pública: o turismo, a maior atividade, está praticamente parado; protestos e greves paralisam a vida civil e criam ainda uma dívida maior. A arrogância de um governo incapaz está provocando a guerra civil, um perigo que poderia se alastrar em todo o continente europeu.
Se estes fatos de arrogância política e de repressão tivessem ocorrido na América Latina, a imprensa européia os teria definido como resultados de uma ditadura agressiva.  Mas, visto que os fatos acontecem na “civilizadissima” Europa, quase ninguém pensa em condená-los. Ao contrário, a mídia parece desviar a atenção da Grécia  para tentar salvar a ideia utópica de uma Europa com  sua moeda. O mesmo  grande projeto sonhado no curso da história dos ditadores europeus   (Napoleão, Hitler), mas nunca realizado.


Noticia  curiosa sobre João Dias
Carlos Adauto Vieira *
Poucas pessoas em São Francisco do Sul estão mais homenageadas do que este senhor: tem uma escola básica na Praia do Forte; uma comunidade na Vila da Glória; uma ilha no Linguado; um cabo marítimo e um morro ( do Forte Marechal Luz) com o seu nome. Tudo no Balneário, se considerarmos a Glória como parte dele.
Mas quem foi ?
Um estudo mais sério e aprofundado dá-nos conta de que nasceu a Lebrixa, na Espanha, no século XV e morreu na Argentina, vítima de uma emboscada, em 1515. Hábil  navegador e cartógrafo acompanhara Pinzon na descoberta e subida do Rio Amazonas até o Peru, descobrindo as Civilizações Incaicas e Pré-Incaicas, tendo antes, descoberto a Península de Yucatan com a sua Civilização Maia em 1508. Nomeado piloto real, quando de sua volta à Espanha, foi encarregado das cartas náuticas e voltou ao Novo Mundo em 1509, para continuar a exploração do continente, iniciada pelo navegador Pinzon. Descendo pelo Atlântico, visita a Rio de Janeiro, mas continua descendo até entrar pela Barra de São Francisco do Sul, atravessar a Baia de Babitonga, fazer contato com os guaranis e os carijós (mistura de guaranis com brancos), em 1510. Tendo encontrado a embocadura do Rio da Prata, volta à terra natal para anunciar a boa nova, recebendo ordens de conquistar o território platino e o explorar para Castela. Com Diego Mendonza funda Buenos Aires. Numa das suas excursões pelo interior do território argentino, vítima de uma emboscada dos índios, faleceu, foi moqueado e comido.
Ele esteve em S. Francisco do Sul, quando navegava para o Prata, cuja existência não desconhecia pelos estudos feitos. Entrando pela Babitonga (Asa de Morcego, segundo os carijós), batizou-o com Ria de São Francisco, braço de mar, em linguagem náutica e para homenagem ao santo, seu padroeiro, no dia 03 de outubro de 1510, aniversário de morte do mesmo. Rios eram confundidos, pelo seu tamanho, seu volume de água com mares. Daí Dulce Mar, Amazonas; Mar Del Plata, o da Prata. E, por sua vez, mares foram, igualmente, confundidos: Guanabara, Rio de Janeiro; Babitonga, Ria (Braço de mar) São Francisco.
A maior curiosidade sobre João Dias é que, tendo estado, aqui, para se reabastecer de água e mantimentos, fez amizade com os carijós e alguns brancos; projetou uma fortaleza no Morro João Dias (hoje do Forte) que defenderia a baia e onde há o Cabo João Dias, para o que deixou cerca de dez dos seus homens de tripulação.
Pelo Canal do Linguado, onde existe a Ilha de João Dias, continua a sua jornada, indo fundear na Ilha de Santa Catarina (então Ilha dos Patos), em cuja ponta sul – Naufragados - nome dado pelo acidente naval àquela, os marinheiros e seu comandante Aleixo Garcia tiveram de buscar terra firme, na região de Palhoça(Maciambu). Ganhando a confiança dos guaranis, casou com a filha do cacique e com ela teve um filho, o primeiro registrado nascido no Brasil. Garcia, curioso,  pelo uso de metais preciosos, como ouro e prata, logrou organizar uma expedição, com a qual descobriu e traçou o Peabiru, Caminho Velho, ligação secular entre o Pacífico e o Atlântico,  traçado segundo o desenho da Via Láctea, pelo qual foi às Cataratas do Iguaçu e ao Peru, em busca de ouro, prata e pedras preciosas. No caminho, descobriu o Paraguai, do qual é considerado herói. Em São Francisco do Sul, há notícias sobre este extraordinário e universal Juan Diaz, porque o seu nome foi, inexplicavelmente, aportuguesado, já que é conhecido em todas as enciclopédias por JUAN DIAZ DE  SOLLIS.
Entre as homenagens, ligando, ainda, mais a Espanha ao nosso Município, em 2010, há que se mudar, definitivamente, do português para o espanhol, o seu nome verdadeiro.
Ilha de São Francisco do Sul, setembro de  2002.

* * * * *
Babitonga
 “ Babitonga ou bopitanga era o nome pelo qual os indígenas chamavam a bela baia, quando os espanhóis ali chegaram no século 16. Conforme Sain-Hilaire, provavelmente, deriva das palavras guaranis “mpobi”, morcego, e tang, novo, tenro. Há, também, a versão do historiador Carlos da Costa Pereira, segundo o qual, a denominação se origina de “mbolpitanga”, cobra vermelha. O nome Babitonga aparece pela primeira vez no mapa do Paraguai, provavelmente feito pelos jesuítas entre 1646 e 1649. Registra, ainda, este autor que a denominação carijó da baia “ benipitanga” ou outro termo parecido, de que babitonga é uma corruptela. Bapitonga, bepitanga, babytonga, como antes era grafado por diversos autores, dá margem a várias interpretações – filho de morcego, mbopi-tanga (Saint Hilaire) cobra coral, mboy-pitang (José Boiteux), lugar contornado pelas águas, babaétoounga, modificado para ibabahétonga, de onde, babetonga, ibabitonga (Coronel Tenório de Albunquerque, (segundo informação prestada ao dr. Affonso Taunay), podendo, ainda, na versão deste tuínólogo, significar “lugar das pitangueiras”. Finalmente, Teodoro Sampaio (O Tupy na Geografia Nacional) define “babitonga” como corruptela de “bopitanga”, alteração de embopitanga, que quer dizer “avermelhar”
Não é fácil uma significação exata. Tanto mais que Charles d´Olengèr, com o seu humor inconfundível, diz que o nome se originou quando o corsário irlandês Addison, ao falar com os nativos da Ilha Encantada e não lhes podendo compreender o linguajar, disse aos seus marujos: “They talk a baby tongue”.
Para complicar alguns pesquisadores afirmam que babitonga – asa de morcego – nasce da forma da Ilha. Não da baia. Pior, como é que os nativos sabiam o formato da Ilha ou da Baia, se não a podiam ver do alto, se não da Serra de Curitiba? Mas, tentou-se explicar.
* Jornalista, escritor, advogado e Presidente da
Academia de Letras e Artes de São Francisco do Sul


Pelo Peabiru ao sambaqui
                        Carlos  Adauto  Vieira[i]
Na sua última gestão na Prefeitura de São Francisco do Sul, o Dr. Alfredo Darcy Addison, uma das mais lastimáveis vítimas da ditadura de 64, me telefonou certa tarde, pedindo-me para acompanhar um antropólogo inglês, que visitava a nossa Ilha Encantada em pesquisas da sua especialidade e justificou: ”Falas bem Inglês e gostas destas velharias”. A última parte era a ironia irlandesa.
Acompanhei o cientista na manhã seguinte.
No sambaqui da Prainha/Praia Grande (Foi o escolhido, embora haja mais de cem no entorno da Babitonga e nas praias do leste/norte) ele se demorou, catando material do mesmo e colocando, delicadamente, em uma enorme bolsa de lona. Faria exames em laboratório londrino, quando retornasse. E remeteria cópia dos resultados para a Prefeitura.
Em dado momento me perguntou se sabia o que era aquela monte de cascas de ostras, mariscos, restos de peixe, siris, ossos humanos e de animais..
- Sambaqui– respondi calmamente. Afinal eu fora aluno do Professor e Padre Allfredo Rohr, no Colégio Catarinense, um dos primeiros a buscar nestes cemitérios indígenas elementos para a análise da vida dos que os constituíram.
- Quem os teria constituído? , perguntou-me
- Indígenas. Índios pré-colombianos. Guaranis e carijós.
- Em parte. Foram os índios de todo o sul da América do Sul, especialmente vindos dos Andes. Povos andinos. E por qual razão? Provavelmente – respondeu a si próprio – para festejar um deus – certamente o Sol – num determinado dia do ano. Guaranis e carijós levariam mais de dez mil nos para obter um monte com tal área e tal altura. Este sambaqui deve ter de cinco a dez mil anos de idade. Guaranis e carijós seriam muito poucos para tanto. Mas os que vieram dos Andes deveriam ser em número superior a cinqüenta mil. Cada leva. E, aqui, ficavam, por muitos dias, celebrando o seu Deus, comendo, bebendo, dançando, casando-se, procriando. De volta às suas aldeias, levavam sobras de ostras, mariscos, siris, peixes, animais, daí o porquê da existência de sambaquis no interior do Brasil. Especialmente, à beira de rios. Como em Foz do Iguaçu.
Incrível a teoria do inglês. Mas que provas?
Meu fraterno amigo Vilson Mendes, editor da Papalivros, me presenteou com uma obra extraordinária “OSTRAS”, sendo autores Denise e Ivan Angelo Trois, a primeira no gênero em que reúnem história, vida dos moluscos, espécies,  métodos de criação e receitas, nclusive uma especial: picanha com ostras.  À página 35, escrevem: “Há mais de quatro mil anos os índios americanos consumiam quantidades enormes de ostras, apreciando-as cozidas. O mesmo acontecia no Brasil. Os índios litorâneos consumiam tantas ostras que com as suas conchas construíram os Sambaquis, verdadeiros morros de casca”.
Meia verdade histórica, mas justificável, porque não se trata de livro voltado à História, mas ao prazer do molusco à mesa.
O escritor e editor Joel Gehlen deu à lume a prova provada da teoria com o ensaio do Professor Olavo Raul Quandt  “PEABIRU, o Caminho Velho”[ii], no qual mostra como os índios há séculos varavam do Pacífico ao Atlântico pelos peabirus, ainda, hoje, existentes, perfeitamente demarcados por vegetação própria, inclusive em Santa Catarina, conforme reportagem na excelente  revista Mares do Sul, em número do ano passado, editado, pelo, também, escritor e editor Werner Zots, narrando a excursão de um grupo de reporteres, pesquisadores  e excursionistas por eles, chegando à Serra do Mar (Três Barras, Monte Crista), na região de Joinville. Rosana Bond com o seu Aleixo Garcia acresceu mais elementos. O Rio Itapocu, que banha Jaraguá do Sul, o Gigante do Vale e Guaramirim, desembocando em Barra Velha, teve as suas margens o Caminho Velho por onde circularam  Álvar Nuñes Cabeza de Vaca, Aleixo Garcia, Doña Mência Calderon de Sanábria, vulto sagrado do Paraguai.
Facilmente por estas trilhas milenares, traçadas pelo desenho da Via Láctea.  os povos andinos chegaram à nossa Praínha/Praia Grande construindo o sambaqui, ali existente, mal explorado, porque deve guardar restos de ostras, mariscos, mexilhões, siris, fósseis de animais e seres humanos, material de trabalho, de cozinha, de mesa, pois nem a Fundação Cultural Ilha de São Francisco do Sul, nem a Secretaria de Turismo, antes, se tinham preocupado em o apresentar aos visitantes e aos nativos, com placas explicativas, como agora acontecerá, da sua importância antropológica, tornando-o ponto turístico e científico de visitação obrigatória. E, igualmente, de pesquisas. O que se poderia fazer com a colaboração do Museu do Sambaqui de Joinville e da Univille.


Carlos  Adauto  Vieira – jornalista, escritor, advogado e pesquisador de História, Presidente da Academia de Letras e Artes de São Francisco do Sul.
dradauto@ilhanet.com.br
[ii] Peabiru – Caminho das montanhas;Ralo;dos Pinheiros;Batido;da Montanha do Sol;para o Peru; de Ida e Volta”.


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